sábado, 1 de setembro de 2012

Proatividade e reatividade



            O pró-ativo antecipa e se responsabiliza pelas próprias escolhas e ações frente às situações impostas pelo meio, enquanto o reativo espera as coisas acontecerem e... reage. Todo mundo tem essas duas partes e suas diversas nuances à disposição, mas também existem pessoas que carregam em suas personalidades a predominância de um desses polos.

            A tendência do pró-ativo é enxergar os problemas antes de acontecerem, e num mundo onde impera a reatividade ele se torna um ser isolado, como no mito de Cassandra, condenada por Apolo a prever os fatos e ninguém acreditar nela.

            Aquele que traz em si um grande percentual de proatividade não é um ser superior, muito menos dotado de capacidades paranormais, apenas enxerga o todo com maior facilidade, com certa distância de sua própria personalidade, consegue – ou é condenado a conseguir – colher informações e emoções que passam desapercebidas em geral.  Talvez seja mais atento e menos centrado em seu próprio ego, vai saber.

            Aquele que traz em si maior percentual de reatividade simplesmente não compreende o pró-ativo: lógico, é provável que as coisas de fato ainda não tenham acontecido, ou o reativo ainda não conseguiu ver as coisas como são, porque estão escondidas com densos véus.

            Enganos nos dois polos existem: às vezes o pró-ativo exacerbou uma semente, real, mas que ainda não germinou nem cresceu e pode muito bem ser extirpada, e o reativo nem sabe como reagir e perde as estribeiras; mas às vezes o pró-ativo acerta no alvo e o reativo “se defende” como pode.  

            São muitas as diferenças de ação, pensamento e sentimentos que distanciam seres pró-ativos e reativos. Enquanto o reativo se defende, pois traz o mundo pra si, considera o externo como um perigo a ser enfrentado e que esse externo o ataca em maneira pessoal, o pró-ativo propõe novas possibilidades, soluções, não consegue levar as coisas pro pessoal porque lhe grita forte uma consciência interna que cada um está trilhando seu próprio caminho; ao mesmo tempo em que separa sua personalidade dos fatos, seu interno e o externo, sabe que o TODO está em tudo, e que interno e externo são uma coisa só, separáveis apenas neste plano da dualidade. Parece contradição, mas acredito que as pessoas que exercem a proatividade entendam o que estou falando. Ou não? 

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

A última vez que te vi



Lembro a última vez que te vi, sentado ao piano, 
corpo moreno em vestes creme compondo 
elegante degrade com as teclas. 

Contrastes suaves, contrastes fortes... 

Contidas pelas persianas doces espadas de luz iluminavam 
a cena, iluminavam sons profundos, 
iluminavam os prateados, 
realçavam suas luzes. 

Aproximei-me devagar para sorver até a última gota daquele instante. Sei que os instantes são únicos, 
tendencialmente vivo o belo com intensidade... 

Aquele momento foi único;  
é único na medida em que recupero, agora,  impressões vívidas guardadas nas memórias, trazidas à tona, reformuladas, redimensionadas, com novas roupas, mas que conservam a inteireza suspensa dos eventos mágicos, do encanto.  

Sem perder o foco caminhei lentamente ao seu encontro 
feito zoom, fruindo o leque de sensações que 
o quadro em movimento  despertava.  

Meu silêncio de gato não funciona com quem tem percepções despertas, então você se levantou pra me receber. 
Nada se quebrou, mas seu olhar trouxe suas palavras 
antes de serem expressas. 

Almas se falam. 

Almas sintonizadas.


             Ainda não compreendi com os parcos meios terrenos, não me importo com isso. Às vezes é assim, milenares amigos que se encontram, se reconhecem, que se sabem apesar de vidas, das atuais vidas, tão diferentes. É um saber de verdade, da natureza profunda, muito além dos caminhos traçados nesta fase, além das escolhas feitas nesta etapa. Encontros de amor incondicional. 

domingo, 26 de agosto de 2012

Quando o emaranhado de fios de lã cinza prendem as pernas


        Parecia tudo bem, colorido, quando o emaranhado de fios de lã cinza prendaram minhas pernas outra vez. Identifiquei o gatilho, mas já era tarde demais. Uma vez desencadeado o processo é difícil, quase impossível transformá-lo. Tentei enfrentar o medo, coloquei-me em movimento, usei inúmeros argumentos racionais, éticos, mas o corpo se mostrou autônomo em sua debilidade. Fui invadida por ânsias, dores de cabeça, a visão começou a turvar. Dei meia volta, fui até onde era possível. Parei. Quando parei, chorei. Chorei muito. Sentia-me cansada, exausta, triste por deixá-los vencer;  inconformada por lhes presentear um dia, um meio dia que seja, do valioso tempo da vida; sentia-me culpada por deixá-los impedir encontros e compromissos;  sentia raiva em deixar vitoriosos os sabotadores de felicidade.  Por fim, simplesmente aceitei. 
        Conversando com minha irmã – finalmente aprendi a receber ajuda! – entendi melhor o que estava acontecendo. Desculpei-me, comigo e com os outros, relaxei. Consegui me perdoar. Da próxima vez que avistar os novelos cinza desenrolando seus fios pra me segurar, espero ser outra, mais hábil, mais forte, melhor instrumentalizada. Tomara que consiga ter em mãos uma paleta rica em nuances para transformá-los em arco-íris com amorosas pinceladas. 

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Sabiá-laranjeira


    
    
    No meio do barulho dos carros, motos, dos gritinhos infantis brincando na escola, do zun-zun-zun das pessoas conversando no celular e da furadeira esburacando o prédio, um sabiá-laranjeira esbanjava suas melodias. 

   Parei. Procurei o bichinho. Fiquei lá, encantada, olhando pra cima, entre a padaria e minha casa. O mocinho estava no meio de galhos secos, estufando o peito alaranjando e soltando o verso. Momento de suspensão, um milagre. Não pensei nada disso que estou falando agora, só olhei e ouvi. Inteira. Una. Identificada. Me senti sabiá-laranjeira... Fiquei com vontade de assobiar, cantar, de harmonizar sons e criar uma sinfonia pássaro-humana... Só que, estranhamente, senti vergonha! E quando olhei pro lado tinha uma figura olhando estranho praquela que tira fotografias do céu, que fica rindo pras flores, que brinca com o cachorro preso na casa de ninguém, que sorri pra quem não conhece, que brinca com as crianças, que faz yoga no parquinho, que medita na piscina, que agradece todos os dias à vida, ao Sol, ao TODO, que sai por aí assobiando, que fala bom dia, boa tarde, obrigada, assim, só porque dá vontade.

     Talvez tenha ficado com vergonha de me sentir tão bem, e de saber que aquela figura se manteve distante, com seu olhar reprovador, mas não chegou perto por falta de sintonia. Talvez tenha ficado com vergonha por ter essa predisposição a colher belezas, e por saber que aquela pessoa vive sempre a se lamentar, e que, apesar de estarmos no mesmo lugar, ela sequer ouviu o sabiá-laranjeira. Ou talvez tenha ficado com vergonha por saber que insensíveis só estariam vendo mesmo uma louca olhando pra cima, parada no meio da calçada e rindo.

    Ao sentir vergonha me desconectei do passarinho. Ele também parou de cantar. Saí do estado de plenitude só porque alguém vive em maneira diferente. Que besteira me importar com o que podem pensar – e falar - de mim...  
     
    Em alguns minutos colhi preciosas informações da vida. Obrigada sabiá, contigo aprendi que posso espalhar meus cantos, expressar minha alma, simplesmente ser, independente dos rumores externos; obrigada figurinha, com você entendi que só depende de mim preservar momentos de encanto.  

domingo, 22 de julho de 2012

Kamenskoye ou Dniprodzerzhynsk


        Papai, ucraniano de Kamenskoye, renomeada Dniprodzerzhynsk em 1936, conterrâneo de Brejnev, adorava a chamada “música clássica”... Ele nasceu em 28, filho de aristocratas que permaneceram na terra natal e sobreviveram à matança dos anos que seguiram a revolução de 17. Brejnev, ainda jovem mas já com cargo importante, resolveu criar uma universidade em sua cidade e meu avó saiu da prisão pra dar aulas de literatura e línguas estrangeiras. Reza a lenda que ele falava e escrevia com fluência 7 línguas, pois era o representante internacional das vendas de ouro das minas da família, que foi assassinada na revolução enquanto ele fazia negócios em Paris. Papai dizia que meu avó só tinha sido chamado pra ser professor na faculdade porque os “comunistas” não tinham outra opção depois de terem acabado com a elite cultural do país... Pontos de vista...Mas lá pro finalzinho da sua vida, finalmente ouvi algo de positivo saído de sua boca sobre aquele sistema, aquela ideologia, aquele “ismo”, que tanto nos distanciou.
         
         Ouvindo juntos a nona sinfonia de Beethoven, regida por Karajan, pela milionésima vez, papai abaixou o som, pediu lápis e papel e, com as mãos trêmulas, fez o desenho acima. Finalizado o desenho (sim, ele fazia uma coisa de cada vez, de um jeito bem europeu.  Como queria ter aprendido isso...) me explicava, com aquele sotaque teuto-ucraniano que nem os cinquenta anos como brasileiro conseguiram apagar: “Bête, antes da revolução, o povo de Kamenskoye vivia debaixo da terra. Escavavam um buraco e colocavam esterco pra segurar as paredes; construíam uma lareira que também servia como saída de ar, e conseguiam assim afastar o frio. Os comunistas destruíram essas favelas subterrâneas e construíram moradias simples, mas melhor equipadas, pequenos prédios de três andares que abrigaram essas pessoas. Primeiro construíram as novas casas, mudaram o povo pra lá, e depois destruíram as favelas. Em cima delas, das antigas moradias, construíram parques pro povo passear, e nesses parques tinham coretos onde todos os domingos se apresentavam orquestras que tocavam Rachmaninoff, Tchaikovsky, Prokofiev.Era a nossa única diversão.”

         Em 1936 os policiais invadiram de madrugada a casa dos meus avós e levaram, na porrada, meu avô pra Sibéria, debaixo dos olhares e súplicas da vovó e das crianças. Essa ação fazia parte da “limpeza” instaurada por Stalin. 

quinta-feira, 19 de julho de 2012

As portas se abriram: entrei no domínio do AMOR



                   Entre amigos, apareceu a conversa sobre mediunidade, e enquanto as pessoas relatavam as percepções que os cinco sentidos não dão conta, bebiam uísque e cerveja. Pensei com meus botões: “será que elas não sacam que assim atraem uns serzinhos de baixa vibração?” Na mesma hora bateu aquela vontade de fumar um marlboro light... Ri sozinha. É assim, cada um com sua LUZ, cada um com sua sombra; nenhum anjo, nenhum demônio. Humanos, simples humanos. Trabalhadores da LUZ? Sim, tantos se esforçam nesse sentido, mas será que sabem realmente o que estão fazendo e pra quem estão fazendo?  Inspirações, insights, intuições, premonições, projeções da consciência...  quem as interpreta? Você, eu; seres humanos.  Interpretamos de acordo com aquilo que somos, com nossa consciência. Uma linda frase do prof. Koellreutter: “O homem é condenado a viver de acordo com sua própria consciência.” Simples assim...

                Minha paciência com algumas coisas acabou.  Não aguento mais “ismos”, nem “istas”, nem aqueles que se autodenominam profetas, mestres, missionários, etc, etc, etc. Só quero saber de gente que sabe que é gente, que vive aqui, agora, no seu tempo; que saiba que sua verdade é uma pequeníssimíssimíssima parte de um TODO incompreensível, dada sua – atual??? - condição humana.  Quero companheiros que saquem seus erros e acertos (e as infinitas nuances entre os dois pólos), abertos à troca, receptivos, inteligentes, que defendam suas ideias respeitando as dos outros, as minhas inclusive, desde que seja possível. Se não for possível existir esse respeito – que é construído ENTRE as pessoas envolvidas, e de comum acordo, que isso fique bem claro! -  aceite a distância.

                Estou chegando na reta final do percurso dessa vida, não tenho mais saco pra aguentar atritos que não sirvam pra deixar minha vida melhor, que me façam crescer. Egoisticamente assim. Existem 7 bilhões de encarnados e, dizem, três vezes esse número rondando por aí; oras, não tenho tempo, numa vidinha como essa minha, pra dar atenção a todo mundo, então... posso escolher. E a escolha se dá através de uma palavrinha mágica, cujo significado – obviamente pessoal - é dado por minha consciência atual. Mutável, mutável...

                As portas se abriram: entrei no domínio do AMOR. 







terça-feira, 19 de junho de 2012

Amor é Amor, ciúmes é enrosco emocional


          Ciúmes é uma meleca emocional, mas quem sente, sente... e quem é o objeto do ciúme, também sente as consequências de uma coisa que nem sua é.   Quem  tem o azar de ter desenvolvido dentro de si  essa emoção sofre, não dá pra negar, é difícil pacas olhar praquela babaquice, saber que não tem nada a ver, mas o troço não te abandona porque te pertence. Aí não tem saída, tem que saber lidar com a sombra, senão ela te engole.


         O lance é como expressar – e se expressar – essa bobeira. Há 15 anos,  passei  férias com uns amigos e, dentre eles, tinha um casal que está junto até hoje. Já dava pra perceber que a relação era forte... A mulher era (e é) muito especial, bonita pacas, sensível, carismática, etc, e o cara também, com uma característica particular e diferente dela, a de ser  daqueles tipos de homens “pavões”,  altamente sedutor e sempre em busca de um novo aplauso feminino. Um dia, estávamos os três no banco de trás do carro e ele, por ser ele e sem nada de particular ou pessoal, estava jogando suas plumas pra cima de mim. Na época ficava muito constrangida com essas situações, era ainda bem imatura, e o que mais me incomodova era saber que se estivesse na posição da mulher dele, já teria descido do carro ou armado o maior barraco. Mas ela não agiu assim. Ô mulher sabida! Lá pelas tantas, interrompeu nossa conversa com muita doçura, fez um carinho no rosto de seu marido e disse: "Você está dando tanta atenção pra Elisabet que estou começando a ficar com ciúmes." Ah, ele desmontou o Don Juan na hora, deram um super beijo daqueles bem amorosos e o cara sossegou o facho. Naquele dia aprendi uma grande lição, ou melhor, ainda estou tentando aprender na íntegra...


             Não acredito que ciúmes seja indicador da presença do Amor, pelo contrário, é só uma  expressão pessoal de carência afetiva, necessidade de marcar território, apego, necessidade de submeter o outro à sua vontade e de controlar a situação. Amor é outra história... amor é aquele lance gostoso, que vibra pelo outro, um bem querer desapegado, um sentir-se bem  na relação estabelecida, o gostar do outro como é e está. Quem ama, quem já amou, sabe que nem sabe porque ama! Amor não tem cobrança, nem tem motivo pra isso, porque só o fato de experimentar esse sentimento basta. Amar é bom demais!


             O Amor tá dentro da gente, todo mundo tem e quer compartilhá-lo nos formatos e expressões que conhece. Existem várias maneiras de viver o Amor, e isso se constrói a dois, de acordo e com respeito às vidas envolvidas, sem forçar a barra, porque tem vezes que dá, tem vezes que não dá. Às vezes rola uma história concreta a dois, às vezes se transforma em outros tipos de relação afetiva, a amizade é uma delas, às vezes tem tanta gosma emocional atrapalhando esse sentimento lindo, que não rola nada mesmo, o Amor sai correndo em disparada. O Amor se assusta com a truculência e se afasta. 


                                           Amor quer Amor...