Lembro
a última vez que te vi, sentado ao piano,
corpo moreno em vestes creme compondo
elegante degrade com as teclas.
Contrastes suaves, contrastes fortes...
Contidas pelas persianas doces espadas de luz iluminavam
a cena, iluminavam
sons profundos,
iluminavam os prateados,
realçavam suas luzes.
Aproximei-me
devagar para sorver até a última gota daquele instante. Sei que os instantes
são únicos,
tendencialmente vivo o belo com intensidade...
Aquele momento foi
único;
é único na medida em que recupero,
agora, impressões vívidas guardadas nas
memórias, trazidas à tona, reformuladas, redimensionadas, com novas roupas, mas
que conservam a inteireza suspensa dos eventos mágicos, do encanto.
Sem perder o foco caminhei lentamente ao seu
encontro
feito zoom, fruindo o leque de sensações que
o quadro em
movimento despertava.
Meu silêncio de gato não funciona com quem
tem percepções despertas, então você se levantou pra me receber.
Nada se
quebrou, mas seu olhar trouxe suas palavras
antes de serem expressas.
Almas se
falam.
Almas sintonizadas.
Ainda
não compreendi com os parcos meios terrenos, não me importo com isso. Às vezes
é assim, milenares amigos que se encontram, se reconhecem, que se sabem apesar
de vidas, das atuais vidas, tão diferentes. É um saber de verdade, da natureza
profunda, muito além dos caminhos traçados nesta fase, além das escolhas feitas
nesta etapa. Encontros de amor incondicional.