sexta-feira, 23 de março de 2012

"Ó, Deus, todo dia tem mesmo que aprender alguma coisa?"

                Como disse uma amiga minha: “Ó, Deus, todo dia tem mesmo que aprender alguma coisa?”  Vou em frente... Ó, Deus, me dá umas férias? Pelo menos um dia??? Tipo assim, ficar largada numa rede debaixo de um coqueiro tomando água de coco gelada e olhando o sol morninho refletido nas ondas do mar... se for possível, que a paisagem seja embelezada por garotões bronzeados e sorridentes jogando futebol lá longe (bem longe!) e uns surfistas exibidos singrando as ondas.  Quem sabe até um eunuco  - sim, um eunuco pra não ter que pensar em nada! - mudo-cego-surdo e lindíssimo, e que só saiba me abanar com plumas coloridas de pavão.  Já que é pra sonhar, que neste dia eu seja invisível, incomunicável e que todas minhas necessidades sejam saciadas sem precisar sequer pensar. Melhor: que nem tenha necessidades! Um dia pra simplesmente estar, sem emoções, pensamentos, reflexões, atitudes, desejos... Sem livros, sem músicas, sem conversas, sem ideias, sem projetos, sem elucubrações ...   


Hmmm...         Que gostoso...                        Hmmm... ... ... ... ... 


hmmmm ...   ...    ...    ...   ...    ...   . . .     .  .  .     




 hmmmmmm               .   .   .                  .  .  .                        .  .  .                    . .  . 
   




hmmmmm           .                       .                       .                                              .                       .                       .                                            








Ai, que chato! Dá pra ser só um meio dia ???







domingo, 11 de março de 2012

Era uma vez uma mulher

Era uma vez uma mulher fraturada e sem consciência de suas fraturas. Uma dor profunda a mantinha num poço escuro, apesar de só saber expressá-la com sorrisos; uma dor escondida pela vergonha de se assumir frágil e vulnerável. Uma dor sufocada. Foram passando os anos, e a dor crescia, e quanto mais tentava sair do poço, mais se afundava; quanto mais procurava novos caminhos, percebia que só conseguia rodar em círculos. As dores aumentaram e acabaram por sair pelos poros, em sua pele, em seus ossos, na fala truncada, no pensamento desconexo, na ausência de vida, e quando achava que não tinha mais nada a perder, perdeu o que sequer sabia ter. Então, começou o regresso ao desconhecido, aquilo que nunca nenhum livro mostrou, que nunca ninguém lhe disse, mas que todo mundo conhece em variadas formas, da sua própria maneira, ao despertar. Começou o regresso ao ponto proibido, aquele que sua couraça fortalecida em anos de afirmação e autossuficiência não permitia. Mas era tudo inconsciente, um movimento interno forte que se dava em rompantes de criatividade. Os rompantes começaram a ter mais constância, e as dores vieram à tona. Era uma vez uma mulher fraturada que indaga sobre os porquês de suas fraturas. 

sábado, 10 de março de 2012

Recorte

Observo percepções, pensamentos, sons... respiro pausadamente e me deixo permeável. Sensível e permeável, como uma esponja. Sinto. Sinto nem muito, nem pouco. Sinto sem medida, sem julgamentos, sem direções, sem controle. Não é vazio o que sinto, a sensação é de plenitude. Não é bom, nem é ruim: é. Pareço ser inteira, pertencente, poderosamente suave, amorosamente forte. Presente. 


quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Tem hora que quero colo


         Tem hora que quero colo. Só isso. Tem hora que quero viver minhas fragilidades, experimentar a vulnerabilidade. Tem hora que quero encostar a cabeça no ombro amigo, mas se não for possível,  encontro os amigos dentro de mim. Tem hora que preciso de carinho, força. Tem hora que preciso me lembrar dos encantos do por do sol, do cheiro de mato molhado, da risada ingênua da criança que brinca em baixo da janela, dos bem-te-vis se despedindo do dia. A hora é agora. Já foi. O instante passou. A alma está brilhando outra vez.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Sacro Ofício

         Quando tinha 19 anos meu pai parou de pagar a faculdade de música: “Bêtê, música não é pra qualquer um. Teu pai não é rico, você precisa arranjar uma profissão que te sustente.” Tentei retrucar, mas ele acabou por me dizer que eu não tinha tanto talento assim. Parte de mim acreditou, outra não, e acabei ingressando numa faculdade pública e arranjando trabalhos com música pra pagar meus gastos. A pressão continuou. Tudo aquilo que não conseguia pagar com meu próprio dinheiro e tinha a ver com a música, era negado, até as aulas com o Koellreutter que parei na época do plano Collor, quando fui demitida da pizzaria que tocava. (Primeiro foram despedidos os manobristas, depois os pianistas...). Mas insisti mesmo assim. Terminei a faculdade de música, saí do Brasil, vivi a maravilhosa experiência com a Associação Cultural Cantosospeso, tive uma excelente formação com o Martinho Lutero e realizei os sonhos que tinha. Voltei pro Brasil sem um centavo, sem trabalho, mas com a perspectiva de ingressar no mestrado, e com a única possibilidade de morar outra vez com meus pais. Mais pressão. Com tudo o que estava acontecendo na minha vida, ainda tive que ouvir: ”Você fez muita música bonita, só que ainda não consegue se sustentar.” Comecei do zero econômico, outra vez, mas não desisti dos meus sonhos, mesmo porque nem tenho como desistir; a música está presente 24 horas por dia, é a única amarra que permito. Hoje entendo meu pai, ele agiu da melhor maneira que podia: quem não tem a música dentro de si é incapaz de entender que não dá pra ser outra coisa. Ela fica grudada o dia inteiro na gente, a cada gesto, pensamento, sensação. Não adianta driblá-la, porque logo vem a cobrança: são os dedos que não deslizam no piano, a voz que desafina, a inspiração que some. Meu pai até tinha razão de que música não é pra qualquer um - a música como profissão - só não sabia que independe de ter ou não pais ricos, porque pra ser músico é preciso estar disposto ao sacrifício. Quem é músico entende o sacro ofício. 

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Livre associações ou Ne più soavi, ah, tacci!

         Ne più soavi, ah, tacci! Tacci, tacci... Thaty era o perfume da adolescência. Azul como o Curaçao Blue, o céu, a Betty Blue, as roupas, as águas, Iemanjá e os olhos que os garotos fantasiavam e se decepcionavam ao enxergar o castanho-esverdeado na loira bastarda. Pensei que os teus eram negros, ochi chyornie, mas eram castanhos, nem tão escuros quanto desejava. De perto a realidade é outra, e as medidas e distâncias são imprecisas. Trompe l’oiel. As percepções afinam ou distorcem objetos, criam verdades passageiras daquilo que é, e pra complicar mais, o que é está em movimento. Só consigo fotografias, um trailer de imagens ordenadas da maneira como a memória me traz agora, neste momento, que .... Ih! Já passou! Ne più soavi, ah, tacci! Tacci, tacci... Cala a boca! Se você pouco entendeu, imagina eu? Para com isso! Nada de abraços e beijinhos sem ter fim, porque acabou nossa história e você, ah, tacci! Será que você gostou de mim? Ir prum cantinho com o violão, cheio de amor no coração, foi o suficiente? Você tem pouco de nuvem passageira, vai e volta, vai e volta, vai e volta... E quem é que era o cristal bonito? Quem é que se quebrou? Jamais escreveria teu nome numa pedra, apesar de caber muito querer em meu coração, Samurai. Só sei que passarinho quis pousar, não deu, voou; and now, cara pálida, o que faço com essa paixão que me devora o coração? Ne più soavi, ah, tacci! Tacci, tacci... Será que são as histórias de amor que inspiram as músicas ou as músicas que inspiram as histórias de amor? Hmm, então tá, será... Será que preciso ouvir novas músicas? E se deixar de ouvir músicas que falam de amor? E se daqui pra frente só ouvir música instrumental? Ne più soavi, ah, tacci! Tacci, tacci... http://www.youtube.com/watch?v=wAPxEW16SCA 

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Do longo inverno ao fluxo dos benefícios recíprocos

         O longo inverno é consequência de um acidente: estava a 200km e de repente freei. Se fosse um fato concreto incidiria diretamente no físico e estaria hospitalizada, só que enxergar o fato psicológico não é fácil. A vida, porém, é sábia, e me tirou tudo naquele momento: estava fraturada emocionalmente, incapaz de assumir responsabilidades condizentes com a maturidade intelectual e profissional. Lógico que naqueles anos sequer entendia o que estou falando agora, mas foram muitos anos, e chegou uma hora que parei de me debater, de reclamar, e aceitei o que a vida trazia. Aceitei, mas também continuei a semear o que queria, a trabalhar, a procurar novos caminhos; e quando falo em aceitar é encarar de frente a situação real e procurar beleza no que é oferecido, sem esquecer dos sonhos. Voltei a me aproximar da espiritualidade, passei por vários grupos até encontrar um que falasse minha lingua, e encontrei o IPPB (www.ippb.org.br), onde se trabalha a espiritualidade em maneira universal, sem preconceitos, sem dogmas, em maneira livre e aberta; que reconhece a manifestação do divino em todas culturas. Ali encontrei as ferramentas que precisava pra desenrolar os nós e encontrar o fio que conduz às essências. Muitos nós foram desatados, e o trabalho é contínuo, mas posso dizer que saí da fase de reabilitação, e a vida tá aí pra mostrar isso. Entrei no fluxo dos benefícios recíprocos. Lembro que tive uma aluna muito difícil, que hoje é deliciosa e grande amiga, mas na época dava vontade de sair correndo, e só não a abandonei porque me pagava muito bem e precisava daquele dinheiro. É, a vida foi legal comigo... Era tão difícil dar aulas pra ela, briguei várias vezes com a figura, e não sei porque sempre queria que voltasse! Foi por causa dela que comecei a me preparar energeticamente antes das aulas, a fazer o que tinha aprendido no IPPB mais umas coisinhas por intuição, como antes de iniciar as aulas me concentrar no pensamento: “Que seja em benefício de todos.” Pronto. Entregue. E nessas de chamar relacionamentos e situações que sejam benéficas ao TODO, mesmo que o benefício não seja evidente no momento, e que não seja exatamente aquele que espero, trouxe leveza no coração, serenidade pra usar o livre-arbítrio. O longo inverno passou; já sinto o cheiro da primavera.