Entre o gramado do campo
Modesto, em paz, se escondia
Pequeno pirilampo
que, sem o saber, luzia.
Feio sapo, repelente,
Sai do córrego lodoso,
Cospe a baba, de repente,
Sobre o inseto luminoso.
Pergunta-lhe o vagalume:
- "Porque me vens maltratar?"
E o sapo com azedume
- "Porque estás sempre a brilhar!"
Poesia do blog http://somentess.blogspot.com.br/2010/07/o-sapo-e-o-vagalume.html
Situações
parecidas na essência se repetem... Quando voltei pro Brasil, comecei a procurar trabalho porque estava na
lona total e precisava realmente de qualquer coisa. Fiz uma entrevista numa escola de música
dessas de bairro e o diretor, além de duvidar em maneira sarcástica do meu
currículo, não me deu o trabalho e ainda saiu com essa: “Só sei falar português”.
Fiquei parada olhando o cara sem
entender nada, e depois dessa frase ele se despediu mais ou menos educado. Não entendi na hora. O que o fato dele
saber ou não mais línguas tinha a ver com a relação de trabalho que tentava
estabelecer?
Fui
gravar algumas músicas num estúdio de bairro nesses dias. Paguei barato, aquele
barato que sai caro. Essa foi terceira e última vez que trabalho com essa
pessoa. Na primeira, as pessoas que encomendaram músicas eruditas me levaram
lá, e na gravação ouvi que saíram rumores da cadeira do piano, mas tirando
isso, a gravação estava boa. Na segunda, falei do rumor da cadeira, trocamos o
assento e gravei três músicas minhas no piano que ficaram muito boas. Só que
desta vez, o trabalho foi péssimo. O
cara foi bem displicente ou é um técnico de som que não ouve o que ouço, ou...
Percebi que estava vazando sons da cabine dele, como movimentos dos pés, da sua
cadeira, mordida na maça que comia enquanto trabalhava... Falei. Ele disse que
não estava ouvindo. Continuamos a gravação e enquanto tocava, continuava a
ouvir os sons da sala técnica. Terminei a música e falei de novo. Ele disse que
não era possível. Aí percebi que tinha um cabo que impedia que a porta se
fechasse totalmente. E nessas já tinha gravado duas músicas... Bom, aí ele
admitiu que podia ser que isso que estava acontecendo. Trocou o cabo, fechou a
porta, mas aí a relação humana ficou péssima. Daí pra frente foi bem triste. O resultado é
que as músicas estão imprestáveis e em duas delas dá pra ouvir o metrônomo.
O
cara disse que era desafinada, que cantava muito baixinho, sem emoção... E
nisso já tinham passado três das cinco horas de estúdio. Não quis reagir pra
não aumentar a tensão. Podia ter perguntado a ele se já tinha ouvido falar de
João Gilberto; podia ter perguntado pra ele o que ele entendia por afinação;
podia ter perguntado a ele com o que ele se emocionava, mas não fiz. Ouvi o que
ele dizia, procurei tratá-lo bem, mesmo porque me pediu desculpas por ter
deixado o microfone da sala de som aberto (um dos possíveis motivos pro som da
mesma ter vazado na gravação) e por ter deixado na gravação o barulho do
metrônomo, que depois de colocarmos o volume no máximo e dele ter escutado em
silêncio, finalmente percebeu. Também voltou atrás no quesito afinação depois
de ouvir a melodia tocada no piano. Queria “corrigir”, porque as notas não
pertenciam ao acorde e lhe soavam estranhas. Entendi que entre nós havia um
abismo e que nossas percepções eram muito diferentes. Paciência. Paguei o cara,
e fui embora bem triste.
O
que existe em comum nessas duas experiências é que algo em mim os incomodou. É
a velha história do sapo que queria ser vagalume, não tem jeito, é um troço que
preciso lidar. Ou então, procurar minha turma.
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