segunda-feira, 28 de maio de 2012

Se você consegue viver sem compor, faça outra coisa



            Soube de uma mulher que depois de uma experiência espiritual começou a “receber” canções e que queria gravar um CD com essas músicas para presentear o Universo. A história foi relatada em maneira fragmentada, e com essas  informações, comecei a questionar esse presente ao universo... 
             Qualquer espiritualista sabe que muitos trabalhos são feitos no anonimato: é o yogue que medita na caverna, é o espiritualista que trabalha energia em casa, é a dona de casa que faz suas orações antes de dormir; é toda e qualquer pessoa que faz  brilhar seu coração, que ama, que quer o bem sem olhar a quem, que se encanta com as nuvens e o céu azul, que transborda amor pela vida, que expande sua LUZ. Então, fico pensando quais são as motivações reais para essa senhora gravar um CD ao invés de cantar sozinha, ou pra sua família, amigos, comunidade? Não seria uma necessidade do ego? E por que não aceitar essa necessidade do ego ao invés de colocar uma capa de espiritualidade generosa e um tanto quanto pretensiosa: presentear o universo !!!  É que às vezes é mais fácil inventar fantasias pra se afastar do cotidiano das experiências particulares de vida do que agir de acordo com a  real expressão de alma nesta encadernação, e estou sendo dura porque o buraco é mais em baixo, bem mais em baixo... 
              Sei de muita gente que “recebe” músicas, pra mim já aconteceu e algumas vezes consigo reconhecer se vem do meu repertório ou se vem de outros lugares. Mas o que as pessoas fazem com essas músicas? Ou melhor, o que podem fazer? Sei o que fazer com o que recebo: escrevo uma partitura, procuro pessoas que possam tocá-las ou eu mesma me apoio no piano e canto. Se quero gravar um CD, saio por aí procurando financiamento ou trabalho como louca pra pagar do meu próprio bolso, porque as coisas neste planeta acontecem assim: a  inspiração pode ser divina, mas a realização é neste plano material. O que quero dizer é que só inspiração não basta, é preciso saber como concretizar, e nem todo mundo é capaz ou está disposto a arcar com os ônus de se tornar um receptáculo apropriado, a desenvolver habilidades que levam anos de estudo cotidiano; nem todos os que são inspirados estão dispostos a mudar suas vidas e colocar a mão na massa, na massa material. 
              Outro dia um grande amigo, quando perguntei por que ele não compunha mais já que suas músicas eram maravilhosas, me respondeu que uma vez ouviu de seu professor: “Se você consegue viver sem compor, faça outra coisa.” Ele consegue viver sem compor, eu não. Fica aí a sugestão pra essa senhora. 

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