quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Em companhia de sacos


          
Estão a carregar sacos, feito papais Noel.

         Um é gordinho, negro, usa óculos e diz que adoçante líquido mata enquanto aqueles que estão no saquinho de papel, ah, esses fazem bem. E fica repetindo enquanto aponta o dedo: "Esse mata, esse faz bem" E repete, repete, repete... A outra é pequenina, magra, quase anã. Tem longos cabelos emaranhados castanho-avermelhados que contornam um semblante sério. No topo da cabeça ostenta uma horrível toca de lã pontuda que a protege do frio ou do sol à pino ou da chuva. Parece um duende. Minha memória até insiste em vesti-la de verde.

         O sem nome entra na padaria sorridente, se faz notar sem palavras, nem precisa! Ele – ENORME - e seus sacos – ENORMES - ocupam espaço, um espaço de tons escuros  como sua pele, suas roupas, seus óculos, seus sacos. A sem nome vagueia pelas ruas com passo decidido, parece ter pressa, talvez pressa em levar seus sacos pra sabe-se lá onde. Ela não para, sempre que a vejo está em movimento, só não parece voar porque ao invés de asas carrega nas costas sacos de lixo pesados, uma fada da sarjeta.

         Os dois são sujos e fedem e se afastam de todos e afastam todos de si. 

Só tem a companhia dos sacos. 


*Gravura: "Os mendigos", de Bruegel (1508)


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